Fim de semana passado eu fui assistir Poor Things meio que sem saber nada sobre filme. Eu não tinha visto nem o trailer. Minha ida foi o resultado de julgar o filme pelo pôster - que é belíssimo por sinal - e ter recebido um convite de amigos pra assistirmos em grupo. Então eu estava sem nenhuma expectativa. Alguém disse que talvez se tratasse de um musical, outro que seria tudo em preto e branco. Entre rumores e informações completamente infundadas, as cortinas do palco se abriram para revelar a tela e finalmente foi hora de se deixar envolver por esse mundo de fantasia esteticamente belíssimo - e meio grotesco - que o filme apresenta.
Meus olhos se deslumbraram com as milhares de referências, com os inúmeros detalhes, com as cidades antigas e futuristas ao mesmo tempo, com os figurinos incríveis e com a performance primorosa da Emma Stone - para mim, merece Oscar e se você não concorda o meu mais sincero só lamento.
Poor Things é um filme que tem potencial para reverberar de muitas maneiras, para agradar em muitos sentidos, mas o que bateu mais forte em mim foi ver essa fome de vida que a protagonista, chamada Bella Baxter, tem. Me arrepiou os pelinhos do braço, me fez sentir aquele frio na espinha, me fez querer te escrever. É arrebatador ver uma mulher tão livre, tão pronta para se descobrir e tão disposta a testar de tudo para só então encontrar o que faz sentido para ela.
Caso você não tenha assistido o filme ou lido o livro de mesmo nome, escrito por Alasdair Gray, aqui vai um pequeno contexto: Bella é uma mulher ressuscitada por um brilhante cirurgião inglês. Em sua sala de operações, ele decide substituir o cérebro de Bella pelo da criança que ela trazia na barriga. O resultado é uma espécie de bebê-criança presa em um corpo de adulta. Bella tem limitações de fala, de locomoção e não lembra nada do passado de quem habitou o seu corpo.
A protagonista tem um cérebro novo, fresco, pronto para aprender tudo do zero e, como ela mesma é um experimento, está parcialmente livre para experimentar. Parcialmente porque, na verdade, a personagem está presa no casarão em que o médico que a “criou” vive. Bella não interage com a sociedade, não sai de casa, até o simples andar de bicicleta é feito dentro da sala de estar.
A medida em que a personagem evolui e que seu despertar sexual acontece, ela vai se dar conta de que essas quatro paredes não são o suficiente. Que ela pode ser feliz. Então Bella quer ver o mundo, quer tocar cada canto com a ponta dos seus dedos ansiosos.
Nesta angústia do novo, Bella decide, contra todos os conselhos de quem quer continuar controlando-a e mantendo-a em segurança, abandonar sua casa por um tempo e viver uma grande aventura, viajando pelo mundo ao lado de um cafajeste. Por não ter vivido em sociedade, Bella não possui aquela típica pressão civilizatória a qual todas nós somos submetidas: ela está despida de julgamentos, culpas, amarras. É indomavelmente livre. Com um ouvido atento ao que ela - e apenas ela - quer. E isso me virou do avesso.
É fácil deixar de se ouvir, principalmente se você for mulher nesse mundo. Coletivamente, nos foi negado o direito de nos colocarmos em primeiro lugar. É egoísmo. E parece não existir característica mais desprezível em uma mulher do que isso. Ser “egoísta”. Se somam as responsabilidades, se sobrepoem as vontades de outras pessoas. As pressões sociais e os papéis de gênero. Todas essas coisas às quais a Bella não está submetida em um primeiro momento e que vai experienciar aos poucos no decorrer da obra.
Entre o arrepio e o deleite, observei essa mulher esfomeada se empanturrar de viver. Devorar ferozmente o mundo como se ele fosse uma porção de pasteis de nata irresistível demais para guardar para depois. Vendo os olhos brilhantes de Bella, o cabelo rebelde, as mangas dramáticas esvoaçando enquanto ela caminhava quase em transe por aí, senti a boca seca, o corpo quente, o sangue correndo rápido. “Eu quero ser mais como ela”, pensei. Mais destemida. Faminta. Curiosa. Capaz de ouvir a minha própria voz cada vez mais alto e realizar os meus desejos, ao invés de abafá-los ou adiá-los. Ter a audácia de não estar satisfeita, mesmo depois de viver um êxtase. Quero experimentar. E quero estar livre de mim mesma para me deixar fazer isso.
Talvez a chave seja a autoescuta. O mergulhar em si. Ir fundo, até não dar pé e ser capaz de ignorar aquela voz censora interna que nos impede de visitar todos esses lugares onde verdadeiramente queremos ir.
Estar cada vez mais no presente me parece outro ponto crucial para uma vidinha mais Bella Baxter. E isso é um baita desafio que eu venho tentando colocar em prática nesse início de ano. Porque entre as redes cada vez mais voláteis, os problemas do dia a dia e a vida entre dois continentes de uma imigrante - sempre divida entre o aqui e o lá - parece impossível habitar apenas este momento. E realmente é difícil, mas essa semana ficou um pouquinho mais fácil: cada vez que eu acordo e encosto no celular meio que por reflexo, eu vejo uma mulher com olhos em chama e cabelo voando em câmera lenta montada em um peixe gigante. Uma imagem lúdica dessas que o cinema é capaz de nos presentear com. Tô até pensando em colocar na parede, uma pena que não encontrei a foto dessa parte do filme ainda, mas só imaginar tem funcionado.
Eu quero ser mais Bella Baxter. Pra ser irremediavelmente mais eu mesma.
A minha pretensão com essa news não era escrever uma crítica do filme, mas sim dividir com você as minhas impressões, mas não posso deixar de falar do figurino INCRÍVEL de Poor Things, assinado pela Holly Waddington. Sério, esse figurino é uma das coisas mais bonitas que eu vi em muito tempo. Acho que a última vez que eu suspirei tanto por um armário foi assistindo The Marvelous Mrs Maisel - série que estará para sempre entre as minhas mais mais.
Para além de encher os olhos e fazer a gente querer estar portando uma blusa ou jaqueta de mangas bufantes imediatamente, o figurino é impecável em contar a história dessa personagem. A gente consegue ver como cada look vai te revelar quem aquela mulher é/em quem está se transformando - e isso é um trabalho absurdo, que vai ser muito bem feito nesse filme. A estética também é muito forte, misturando elementos vitorianos com futuristas para criar imagens deslumbrantes.
Num primeiro momento a gente tem a personagem da Bella infantil, presa em casa, com uma empregada para vesti-la. Ela vai usar muitas camisolas, camisas e calcinhas, nesse look sempre meio desarrumado, como uma criança que vai despindo o que incomoda ao longo do dia, sabe? Algumas das peças parecem até mesmo protegê-la de se bater nos espaços, como uma camada protetora.
Quando a protagonista embarca em sua aventura, a gente vê uma mudança drástica, porque ela vai se vestir sozinha pela primeira vez, misturando o que bem entender entre as opções que tem. E vale destacar, como eu já mencionei, que Bella é uma mulher livre, no sentido de que não tem imposições da sociedade. Então ela vai usar de um tudo, vai mudar as funções das peças, transformando anáguas transparentes em saias ou até blusas, robes leves como casacos e assim por diante.
Um ótimo exemplo isso é o look icônico com a calcinha amarela usada como short, combinada à jaqueta de mangas bufantes azul, e à bota branca meio anos 60. Então ela está vestida na parte de cima de uma forma “completa”, com camisa e casaco, mas na parte de baixo não vai colocar uma saia longa combinando. Vai usar esse short prático e funcional, que pra outras mulheres é uma lingerie que não deve ser mostrada em praça pública.
Cada uma das aventuras da personagem vai estar refletida em como ela se veste e isso é o que um bom figurino deve fazer. Então sigo impactada (ou um pouco obcecada) até agora! Oscar winner!!!!
Dicas para acompanhar o chá
Chegou aquele momento de compartilhar algumas dicas para você aproveitar os seus tempos de pausa com mais qualidade.
Vidas passadas
Ai, como estamos cinéfilas hoje, hein? Finalmente estou retomando meu hábito de ir ao cinema com mais frequência e no finzinho de 2023 assisti Vidas passadas. Saí do cinema completamente apaixonada! Esse filme é de uma beleza e de uma sensibilidade absurdas, me impressionou demais mesmo.
O filme conta a história de Nora e Hae Sung, dois amigos de infância que possuem uma conexão mega profunda, eles são tipo aqueles amiguinhos inseparáveis, mas acabam tendo que se separar quando a família da Nora decide se mudar da Coreia do Sul para Toronto. Os dois se reencontram online, conversam muito e fica aquela sensação platônica de que poderia acontecer algo. De que o que eles têm é muito especial. Mais vários anos passam e Hae Sung vai para Nova York visitar Nora, que neste momento já está casada com um estadunidense. A partir daí ela vai ter o passado e o presente lado a lado, além de versões distintas de si mesma e da vida que poderia ter.
A primeira cena do filme já me pegou em cheio e deixou muito curiosa para entender como todos os personagens chegam nessa situação. O mais interessante é que descobri que essa parte foi inspirada em uma experiência que a diretora e roteirista do filme, Celine Song, viveu de verdade.
Vidas passadas é repleto de sutilezas, de silêncios que dizem tudo. De uma Nova York que fica em segundo plano para a história desses personagens. Uma história íntima, que nos consome por inteiro e faz pensar em todos os “e se” que colecionamos em uma vida. Destino, amor, diferenças culturais, vidas possíveis e impossíveis são alguns dos temas que esse filme vai abordar e ele é muito eficiente em fazer isso. A direção é ótima e os atores também, dá pra entender o ponto de todo mundo, torcer por eles e ver que a vida e as relações são muito mais complexas do que a gente é levado a acreditar.
Filme lindo, lindo, lindo, que está nos meus favoritos do ano que passou, mas também entre meus preferidos dos indicados ao Oscar também. Talvez o mais especial de Vidas passadas seja que ele toca num cantinho muito específico do coração, nesses sentimentos que a gente nem sabe nomear direito, mas que sabe sentir. Indico demais!
E se você gostou do plot ou já assistiu o filme, fica a dica de ouvir esse episódio do Cinemático, porque eles estão tão obcecados com a Celine e com o filme quanto eu.
Meninas malvadas
Quem me acompanha no Instagram já sabe que eu amei, amei, A-MEI a nova versão de Meninas Malvadas para o cinema. Eu sei que já se falou bastante do filme, então vou deixar só uns breves comentários.
A nova versão é divertidíssima - dei risada alta no cinema, uma hora até gritei, veja o destempero. Acho que o filme conseguiu atualizar bem algumas questões do antigo, mantendo a história original que se tornou um ícone da cultura pop. As músicas são ótimas, as personagens também- e fica aqui o destaque mais do que merecido para a Reneé Rapp, que apenas lacrou como Regina George. Num resumo, filme perfeito para assistir com amigas ou para ter um date gostosinho consigo mesma e esquecer todas as preocupações do mundo exterior.
Muffin de maçã com farinha de aveia
Talvez eu tenha ficado empolgada com a nossa editoria “dicas para acompanhar o chá” e sido literal demais, talvez esses muffins sejam apenas bons demais para ficarem restritos ao lanche da tarde aqui de casa. Então bora compartilhar essa receita facinha que eu tenho feito literalmente toda semana.
Você vai precisar de:
2 maçãs cortadas em cubinhos
3 ovos
¼ de xícara de açúcar mascavo
¼ de xícara de óleo
1 xícara e ½ de farinha de aveia
1 colher de sopa de fermento
canela
sementes à gosto (opcional): eu usei um mix pronto do mercado que vem com chia, semente de abóbora e gergelim
Como fazer?
Misture os ovos, o açúcar e o óleo, depois coloque a maçã e a farinha de aveia aos poucos, mexendo sempre. Adicione as sementes, a canela e, por último, a colher de fermento. Coloque em forminhas de cupcake e leve ao forno em 180º de 20 a 30 minutos. Eu deixo 20 e então dou uma olhadinha, se estiver dourado por fora está pronto!
Meus dias na livraria Morisaki, Satoshi Yagisawa
Está procurando um livro levinho, fácil de ler e que seja curto? Achou! Um best-seller traduzido para mais de 20 países, Meus dias na livraria Morisaki é uma celebração aos livros, às livrarias e ao poder que a literatura tem de nos ajudar a superar momentos difíceis.
Eu poderia escrever muito mais, porém, fiz melhor do que isso e gravei um vídeo inteirinho falando dos pontos positivos e de algumas críticas que tenho ao livro. Bora de play?
Fica o convite também de se inscrever no canal do Pausa para o Chá para acompanhar as futuras e passadas resenhas, além de vídeos de viagem. É rapidinho e faz muita diferença para mim :)
É isso, espero que cê tenha gostado dessa news, especialmente que tenha batido a vontade de assistir Poor Things por aí. Vai que cê também entra pro clube das famintas? A gente merece grandes aventuras.
Um beijo, até o nosso próximo chá ♥️